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BIOFUTURO: O MAPA DO CAMINHO DA TRANSIÇÃO ENERGÉTICA GLOBAL

Pode-se dizer que o ano de 2015, em que foi assinado o Acordo de Paris, foi quando o mundo despertou para a necessidade de fazer mais para combater a mudança do clima, o mais premente desafio existencial que se coloca à humanidade hoje. Naquele momento, traçou-se o objetivo: manter a elevação de temperatura global bem abaixo de 2º C, e fazer o que for possível para mantê-la abaixo de 1.5º C.

Não estavam, porém, muito claros os caminhos, as ações, as transformações e os marcos temporais em que elas precisariam ocorrer para que o objetivo seja alcançado. De lá para cá, esse mapa do caminho vem sendo progressivamente definido. Não de forma centralizada e negociada, como no Acordo de Paris, mas por meio de inúmeros debates, anúncios e projetos em múltiplos foros e em múltiplos níveis. Nesse processo, avanços e retrocessos são comuns, bem como a coexistência de visões muito diferentes sobre quais seriam as prioridades e quais as melhores soluções.

Ainda estamos longe de ter um mapa do caminho completo e compartilhado por todos. Mas já podemos afirmar que 2021 está sendo um ano decisivo para assentar marcos importantes. O retorno dos EUA ao Acordo de Paris, a Cúpula de Líderes Climáticos organizada pelo Presidente Biden em abril, e os compromissos recentes por Brasil, China, EUA, Japão e outras nações de alcançar emissões líquidas zero em 2050 dão contornos práticos e mais ambiciosos ao nosso mapa do caminho. Os anúncios são um avanço em relação à primeira leva de Contribuições Nacionalmente Determinadas (CNDs) que surgiram com o Acordo de Paris, e que, em seu conjunto, estavam muito aquém de atingir os objetivos centrais do próprio acordo.

No último dia 18, a Agência Internacional de Energia (AIE) deu mais uma contribuição importante para os contornos desse mapa com o lançamento de seu “Roadmap to Net Zero”, trabalho detalhado em que a Agência apresenta uma projeção prática, quantitativa, detalhada, de quais as soluções precisariam ser implementadas, em que ritmo, e em que escala, se quisermos de fato chegar a 2050 com emissões líquidas zero de gases de efeito estufa no setor energético. As conclusões são ambiciosas: para atingir o objetivo, o mundo precisaria cessar quase imediatamente novos investimentos em extração de fósseis, incluindo petróleo, gás e carvão, e quintuplicar o ritmo de melhora da eficiência energética média global, entre diversas outras transformações. Quero, porém, ressaltar o que o relatório projeta para papel da bioenergia.

Segundo a Agência, a oferta global de bioenergia moderna e sustentável deverá quintuplicar nos próximo 30 anos, passando dos atuais 20 para cerca de 100 Exajoules de energia. A produção de biocombustíveis deverá mais que quadruplicar, de 1,6 para 7 milhões de barris equivalentes de petróleo ao dia. Dada a cessação de investimentos em fósseis, considerada necessária pela Agência, a bioenergia terá papel essencial, mesmo diante de forte eletrificação dos transportes leves e da indústria.

Estamos prontos para realizar na prática esse cenário? Segundo os estudos e debates promovidos pela coalizão internacional Plataforma para o Biofuturo, que tive a oportunidade de conduzir desde seu lançamento, em 2016, durante a COP-22, em Marraquexe, ainda há muitos obstáculos a serem superados para que ocorra a esperada aceleração de investimentos no setor. Entre outras medidas, será necessário implementar políticas públicas consistentes de incentivo; acelerar o desenvolvimento tecnológico e a competitividade dos processos produtivos; aumentar oferta de financiamento adequado, inclusive do chamado “financiamento verde”; e alcançar maior consenso internacional sobre qual a disponibilidade de biomassa para uso energético e em químicos e materiais alternativos aos de origem fóssil, sem que a sustentabilidade seja prejudicada.

Apesar da necessidade patente de acelerar a bioenergia sustentável e de baixo carbono, não é um dado que essas medidas irão ocorrer. O planeta encontra-se ainda em uma encruzilhada, ou, melhor dizendo, em um grande carrefour em que muitos são os cenários futuros possíveis para o processo de transição energética. Interesses econômicos, políticos e estratégicos de toda ordem disputam a primazia das soluções de transição energética e tentam criar “favoritos”, que recebem atenções, incentivos e subsídios em montantes nem sempre condizentes com o seu real potencial de contribuição para o clima. Uma lição importante do relatório Net Zero é que não há balas de prata, e que um leque equilibrado de soluções precisará ser desenvolvido simultaneamente.

Essa mensagem tem sido consistentemente veiculada pela Plataforma para o Biofuturo, uma iniciativa internacional eminentemente brasileira, que conseguiu, nos cinco anos desde sua criação, evitar que a bioenergia caísse no esquecimento, devolvendo-a ao radar das organizações internacionais — incluindo a própria AIE — e de formuladores de políticas públicas ao redor do mundo.

O Brasil, vale dizer, tem uma experiência de décadas no setor de biocombustíveis, e as vantagens da alta eficiência e baixa pegada de carbono do seu setor bioenergético derivado da cana-de-açúcar, capaz de fornecer, de forma cada vez mais flexível e moderna, eletricidade, energia térmica, etanol, biogás, biometano e, mais recentemente, bioplásticos e materiais avançados. No futuro próximo, o etanol poderá ser alimentar a economia do hidrogênio e servir de insumo à produção de biocombustíveis de aviação em refinarias integradas. O governo brasileiro tem ajudado a nutrir esse potencial, apoiando-o com políticas avançadas como o RenovaBio, e explorando novas soluções e rotas produtivas por meio do recém lançado programa Combustíveis do Futuro. Não é à toa que a política externa e a diplomacia brasileiras, em governos sucessivos, têm avançado consistentemente no projeto de promoção internacional da bioenergia e da bioeconomia, incluindo por meio da concepção, lançamento e construção da Plataforma para o Biofuturo.

Nesta segunda feira, 24 de maio, a Plataforma para o Biofuturo promove a segunda edição de sua principal conferência de debate de políticas públicas, o Biofuture Summit II. Com um toque especial: a conferência (que é fechada a inscritos, mas cuja abertura é pública), marcará a passagem da Presidência da Biofuturo, do Brasil para os Estados Unidos.

Trata-se de um desenvolvimento significativo. A passagem da presidência aos EUA demonstra o amadurecimento institucional da Biofuturo e reforça ainda mais sua credibilidade como principal instância multilateral de promoção da bioenergia sustentável.

O fato de que os EUA, sob administração Biden, tenham pleiteado assumir a presidência da Biofuturo é uma mostra da relevância internacional que a iniciativa angariou sob a presidência brasileira, e abre caminho para reforçar ainda mais o trabalho que a coalizão tem promovido para inserir a bioenergia e a bioeconomia no centro do debate sobre transição energética e o combate à mudança do clima. Fica comprovado que uma iniciativa brasileira pode se tornar uma instituição de alcance global, empenhada nessa complexa, e por vezes combativa, construção do mapa do caminho.

Biofuturo: o mapa do caminho da transição energética global*Renato Domith Godinho, chefe da Divisão de Promoção de Energia (DEN) do Ministério das Relações Exteriores, é diplomata de carreira, formado em jornalismo pela Universidade de São Paulo, com mestrado em Diplomacia pelo Instituto Rio Branco (2005). Ao longo de 17 anos de carreira diplomática, atuou em diferentes temas e setores, incluindo Mercosul, Unasul, agricultura, nutrição e segurança alimentar, organizações internacionais, política humanitária, atuação consular, gestãoe administração, relações bilaterais, relações multilaterais, sustentabilidade e energia. Entre suas funções na chefia da DEN está a atuação como presidente da Plataforma para o Biofuturo, iniciativa multilateral lançada pelo Brasil em novembro de 2016, com a participação de 20 países, e que busca promover a bioenergia e a bioeconomia avançadas na esfera internacional.

*Renato Domith Godinho, chefe da Divisão de Promoção de Energia (DEN) do Ministério das Relações Exteriores, é diplomata de carreira, formado em jornalismo pela Universidade de São Paulo, com mestrado em Diplomacia pelo Instituto Rio Branco (2005). Ao longo de 17 anos de carreira diplomática, atuou em diferentes temas e setores, incluindo Mercosul, Unasul, agricultura, nutrição e segurança alimentar, organizações internacionais, política humanitária, atuação consular, gestãoe administração, relações bilaterais, relações multilaterais, sustentabilidade e energia. Entre suas funções na chefia da DEN está a atuação como presidente da Plataforma para o Biofuturo, iniciativa multilateral lançada pelo Brasil em novembro de 2016, com a participação de 20 países, e que busca promover a bioenergia e a bioeconomia avançadas na esfera internacional.

Fonte: UNICA

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