Mesmo largando na frente, Brasil pode ficar para trás na corrida pela economia verde
Os subsídios dos Estados Unidos e da União Europeia para alavancar a indústria verde em seus territórios podem ameaçar os planos do Brasil de ser um grande fornecedor global de energia limpa. É o que aponta a diretora de infraestrutura, transição energética e mudança climática do BNDES, Luciana Costa.
“Temos um cenário promissor no Brasil, com vantagens comparativas para se tornarem vantagens competitivas e riqueza. Mas temos um desafio grande: precisamos de capital”, disse ela durante um evento do Insper nesta terça-feira, 30.
“Olhando para o cenário global, a Lei de Redução da Inflação (IRA, na sigla em inglês) e o Green Deal Europeu são ameaças, sim, para o Brasil, porque nosso custo de capital é muito maior que na Europa e Estados Unidos”, explica.
No encontro, o Insper lançou um documento com “inspirações para a retomada verde no Brasil”, a partir de experiências do Chile, China, França e Estados Unidos.
Financiamento para a transição
O Ministério da Fazenda trabalha em um pacote de medidas para “transição ecológica”. Previsto para ser apresentado em agosto, ele deve ser dividido em seis eixos e incluir pontos como mercado regulado de carbono, bioeconomia, transição energética e hidrogênio verde.
Neste contexto, o caso do hidrogênio tem atraído bastante atenção. A Europa precisa descarbonizar sua matriz e prevê uma demanda de 20 milhões de toneladas de hidrogênio em 2030.
Como metade deste volume será importado, o hidrogênio verde pode ser uma oportunidade para o Brasil, que tem uma das matrizes elétricas mais limpas e competitivas do mundo.
Hoje, o país tem mais de 1,5 milhão de toneladas de hidrogênio verde em projetos anunciados, algo que demandará mais de 15 GW de novas usinas de energias renováveis; 8 milhões de módulos fotovoltaicos instalados; 1.500 aerogeradores eólicos; 60 TWh ao ano de eletricidade; e mais de 1,2 mil km de novas linhas de transmissão.
Mas, para materializar os investimentos – que já são calculados em US$ 30 bilhões só com o que foi anunciado até o início de 2023 –, será necessário atrair uma combinação de capitais públicos e privados.
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“O investimento em uma planta de hidrogênio verde custa US$ 1,5 bilhão. Vamos precisar do capital privado, do capital de fomento, do governo e do capital internacional”, comenta Luciana Costa.
Ela conta que o BNDES tem estudado esse mercado e uma das conclusões é que, para fomentar investimentos na cadeia, é preciso fomentar demanda.
E aí vem a segunda parte da história: “Temos todo esse potencial energético. Vamos nos contentar em exportar energia para a Europa? Ou vamos subir na cadeia de produção e começar a exportar produtos verdes?”, questiona a diretora.
“Para que a gente rompa com o modelo primário e comece a exportar produtos verdes, vai ter que ter muito investimento na cadeia toda”, Luciana Costa (BNDES)
Entre os exemplos de áreas que precisam de recursos, ela cita aço, alumínio, amônia e fertilizantes verdes, que “ainda não têm um prêmio, mas rapidamente terão”.
“O [presidente dos Estados Unidos, Joe] Biden não tem um governo muito forte. Ele conseguiu aprovar os subsídios bilionários do IRA porque Democratas e Republicanos concordam em uma coisa: eles estão lutando contra a China”, reforça.
A executiva avalia o IRA como uma reação à migração da indústria dos EUA para a China. “O programa é sobre comprar produtos nacionais. Tem uma guerra comercial junto com o IRA. E o Green Deal Europeu nada mais é que uma reação a ele”, avalia.
“No fundo, estamos vivendo uma revolução energética. A primeira foi do carvão, a segunda do petróleo e a terceira é a de baixo carbono. É uma revolução de ruptura tecnológica. Com ela vem oportunidades também”, conclui.
Por Nayara Machado, via Nova Cana