Já temos tecnologia pronta para mover carro elétrico a partir do etanol
Ele tem o tamanho de um smartphone e está prestes a revolucionar o universo da geração de hidrogênio a partir de fontes renováveis.
Trata-se de reator químico compacto (microrreator). Em resumo, ele produz hidrogênio embarcado a partir de etanol dentro do veículo por meio de célula combustível e gera eletricidade para funcionar o motor.
Tem mais: este processo já está em escala para uso e foi desenvolvido por pesquisadores do Laboratório de Otimização, Projeto e Controle Avançado (LOPCA) da Faculdade de Engenharia Química da Universidade de Campinas (FEQ Unicamp).
Vale lembrar que o protótipo, coração do sistema, tem apenas cinco centímetros de comprimento. Devido a essas características, a eficiência e o controle das reações são melhoradas, quando comparadas aos reatores convencionais.
Destaques da tecnologia:
Microrreator: reformador com dimensões reduzidas, através do qual se alimenta com o etanol de um lado e se obtém o hidrogênio do outro
Qualidades: as reações químicas ocorrem em espaço confinado e trazem os benefícios de intensificação de processos, maximizando as transferências de calor e massa e, portanto, propiciando altas conversões em tempo muito reduzido.
Como é produzido: as placas que apresentam uma malha de microcanais são feitas por impressão 3D em dispositivos específicos para metais. Com o uso da manufatura aditiva em processos de fabricação, permite-se o emprego de softwares de otimização topológicas e design.
Quantos microrreatores são precisos para mover um veículo: depende das especificações. Para escalar até a potência que seja suficiente ao veículo, multiplica-se o número de módulos reacionais.
Por que o etanol: é biocombustível produzido em larga escala no Brasil e, assim, já sabemos como armazenar e manusear essa substância. Além disso, há infraestrutura nacional de produção que gera empregos e renda.
Redução de emissão de poluentes: é outra vantagem. Embora a reforma do etanol para obtenção do hidrogênio possa gerar uma quantidade de carbono no processo, essa emissão pode ser zerada quando considerada toda a cadeia agroindustrial.
“Já podemos entrar em escala comercial”
Para saber mais sobre a tecnologia, JornalCana entrevista um dos ‘pais’ do microrreator, Rubens Maciel Filho, professor de Engenharia Química da Unicamp e coordenador do LOPCA.
JornalCana: Uma vez que já há protótipos do microreator e facilidade de produção dos reatores via 3D, é possível estimar em quanto tempo a tecnologia poderia entrar no mercado brasileiro?
Rubens Maciel Filho – A tecnologia já está pronta para entrar no mercado brasileiro. Temos pleno domínio da tecnologia de impressão 3D em metais, polímeros e cerâmica e temos trabalhado neste assunto desde o ano 2000, quando ainda não se falava desta tecnologia.
Portanto, já podemos entrar em escala de produção industrial.
JornalCana: A tecnologia também pode ganhar o mercado internacional onde há produção de etanol?
Rubens Maciel Filho – A tecnologia de manufatura tem interesse mundial e sua aplicação para produzir Hidrogênio a partir do etanol com certeza vai despertar interesse em todo os países que produzem etanol e mesmo naqueles que não produzem, mas podem comprá-lo.
Rubens Maciel Filho
Será possível contribuir muito com a redução das emissões de CO2 e se aproveitar da infraestrutura já existente no Brasil e nos países que comercializam etanol para se obter uma forma muito eficiente de propulsão dos veículos, inclusive pesados e de máquinas agrícolas.
JornalCana: Essa tecnologia pode acelerar o desenvolvimento de motores elétricos híbridos (a células a etanol) de caminhões e ônibus, também muito utilizados pelo setor sucroenergético?
Rubens Maciel Filho – Esta tecnologia permite a eletrificação dos veículos produzindo o hidrogênio no próprio veículo que é abastecido com etanol, e este hidrogênio alimenta a célula de combustível.
É uma forma eficiente de eletrificação de toda a frota (carros leves, caminhões, ônibus e máquinas agrícolas) e, reforço, aproveitando a infraestrutura de distribuição dos postos de combustíveis já existentes.
JornalCana: Em conteúdo da Agência de Inovação da Unicamp (Inova), é citado que o etanol a ser adicionado no microrreator não é o anidro e nem o hidratado, até por usar mais água.
E que o tanque terá, na verdade, na comparação com o tanque com etanol convencional, apenas 50% porque os demais 50% serão de água. Isso gera economia em escala para toda a cadeia. Comente mais a respeito, por favor.
Rubens Maciel Filho – Sim, isso gera economia em vários sentidos. Uma parcela significativa dos custos, na parte industrial de produção de etanol, está relacionada com os gastos de energia e investimentos nos processos de separação e purificação do etanol.
Com este processo de produção Hidrogênio de forma embarcada (on-board), o etanol pode conter 50% de água, não sendo necessário, portanto, obter o etanol hidratado para a propulsão dos veículos.
Isso também tem um impacto na contagem das emissões de CO2 por quilômetro rodado, pois vamos poder andar com o veículo mais quilômetros com um litro de etanol.
JornalCana: E ajudará inclusive na produção do biocombustível.
Rubens Maciel Filho – Sim. Assim, os dados de número de litros de etanol por hectare e por quilômetros rodados são favorecidos. Ou seja: com um hectare de cana vamos poder rodar muito mais quilômetros com a tecnologia proposta e isso tem impacto direto nas emissões.
Ao descartar emissões durante o processo de geração do Hidrogênio, e de fazer o motor rodar com emissões mínimas, a tecnologia ajuda a consolidar o etanol como redutor de emissões.
JornalCana: O que é preciso para que o microreator chegue de vez ao mercado?
Rubens Maciel Filho – Como já comentado, a quantidade de quilômetros rodados por hectare de cana será significantemente maior levando a uma redução nas emissões.
O microrreator está pronto para ser comercializado e somente é necessário construir o número de elementos de acordo com a potência desejada.
Temos todo o domínio da tecnologia com patente concedida no assunto.
JornalCana: Fique à vontade para comentar mais a respeito da tecnologia.
Rubens Maciel Filho – É importante ressaltar que esta tecnologia foi desenvolvida dentro da Unicamp por nosso grupo de pesquisa (Rubens Maciel Filho, André Luis Jardini Munhoz e Aulus Roberto Romão Bineli) e, portanto, é uma tecnologia nacional que se adequa perfeitamente aos anseios atuais.
Tivemos esta visão de pesquisa e aplicação já em 2009 e fizemos a solicitação de patente em 2011 sendo que a mesma foi concedida em 2017.
Agora que muitos países e empresas enxergam no hidrogênio verde uma opção importante, nós nos sentimos satisfeitos em poder oferecer uma tecnologia nacional que atenda aos anseios do mercado, do meio ambiente e é muito adequada para as necessidades e realidade brasileira.
Por Delcy Mac Cruz e Redação, via Jornal Cana