PARA LER COM CALMA! QUE AS CHUVAS CONTINUEM SOBRE NOSSOS CANAVIAIS! - POR MARCOS FAVA NEVES, VÍTOR NARDINI MARQUES E VINÍCIUS CAMBAÚVA
Na economia mundial e brasileira
O Boletim Focus (Bacen) de 4 de fevereiro, do Banco Central, trouxe as expectativas econômicas para este ano e o próximo, sendo: para o PIB (Produto Interno Bruto) espera-se um crescimento de 0,3% em 2022 e de 1,53% em 2023; já para o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), a estimativa é de 5,44% este ano e em 3,50% no próximo ano; o câmbio deve ficar em R$ 5,60 no final de 2022 e em R$ 5,50 no final de 2023; e a taxa Selic deve fechar o ano em 11,75% e em 8,0% em 2023.
• O Fundo Monetário Internacional (FMI) reviu suas estimativas para o crescimento econômico mundial. Segundo a organização, o desempenho do PIB global em 2021 foi de 5,9%, e espera-se uma alta de 4,9% em 2022.
• Já o preço do petróleo segue firme devido à demanda forte, problemas logísticos e tensões geopolíticas. Goldman Sachs prevê alta até 2023, chegando a US$ 100 neste terceiro trimestre.
• De volta ao Brasil, estima-se que pouco mais de 50% dos R$ 300 bilhões distribuídos no programa de Auxílio Emergencial foram gastos em alimentos. O Auxílio Brasil em 2022 deve ter efeito semelhante, beneficiando o consumo no mercado interno.
No agro mundial e brasileiro
• Nas atualizações de fevereiro da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a safra brasileira de grãos 2021/22 foi revista de 284,4 (janeiro) para 268,2 milhões de t; redução de 5,7% em um mês, mas ainda 5,0% maior que a produção total no ciclo passado. A redução é resultado das fortes secas que afetaram importantes regiões produtoras, especialmente no sul do Brasil, além do excesso de chuvas em estados do Centro-Oeste. A principal alteração se deu para a cultura da soja, que caiu de 140,5 para 125,5 milhões de t, baixa de 10,7%. Com isso, a produção da oleaginosa deve ser 9,2% menor neste ciclo em comparação ao passado. Já o milho não sofreu variações significativas na nova estimativa, permanecendo com a produção total estimada em torno de 112,3 milhões de t, alta de 29,0% na comparação com 2020/21. Deste total, 23,4 milhões de t serão produzidos em 1ª safra e o restante – 87,9 milhões de t em 2ª ou 3ª safras. A área de milho 2ª safra também foi levemente reajustada para baixo este mês, em 0,2%, agora estimada em 20,89 milhões de ha (+4,8%). Por fim, o algodão deve entregar 2,71 milhões de t de pluma (+15,0%) em uma área de 1,53 milhões de ha (+12,1%).
• Em relação ao progresso das operações da safra atual, a Conab estimou que até o dia 05 de fevereiro, 16,8% das áreas de soja já haviam sido colhidas no Brasil, contra 3,6% na mesma data do ciclo passado. Já a colheita do milho verão (1ª safra) está em 14,6%; era de 12,0% há um ano. Do lado do plantio, a semeadurada safrinha (2ª safra) do cereal registrou progresso de 22,4% até o momento, valor bem superior aos 4,1% no mesmo período de 2021 – estamos confiantes de que, se o clima ajudar, teremos bons resultados com o milho este ano. Por fim, no algodão, o plantio alcançou 79,6% da área total no país, contra 66,6% em 04 de fevereiro de 2021. Ritmo acelerado nas principais cadeias do agro brasileiro; no campo, os produtores estão dando um show, como sempre!
• Já em âmbito global, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) divulgou novo relatório onde estima a safra global de milho em 1.205,3 milhões de t, cerca de 0,1% menor que a estimativa do mês anterior, mas ainda 7,3% maior que a oferta de 2020/21. Nos principais países produtores, segue o cenário: a produção foi mantida nos EUA em 383,9 milhões de t; também a mesma do relatório anterior para a China, de 272,5 milhões de t; no Brasil, a oferta foi levemente revisada para baixo, de 118 para 115 milhões de t; e na Argentina, também foi mantida em 54 milhões de t. Na nova previsão, os estoques globais de milho foram indicados em 302,2 milhões de t, 0,3% menor que a estimativa de janeiro, mas ainda 2,8% maior que na safra 2020/21 (292,0 milhões de t).
• Para a cultura da soja, o USDA indica uma oferta também inferior no relatório deste mês, mas de certo modo conservadora na comparação com outros órgãos. A produção global da oleaginosa está indicada agora em 363,9 milhões de t, contra 372,5 milhões de t na estimativa de janeiro, e 366,2 produzidos em 2020/21. A baixa se deu especialmente pela redução da produção no Brasil, que agora deve entregar 134,0 milhões de t, contra 139,0 na estimativa de janeiro e 138,0 no ciclo passado. Estados Unidos, Argentina e China tiveram suas produções estimadas em 120,7, 45,0 e 16,4 milhões de t, respectivamente – praticamente os mesmos valores do último mês. Com isso, os estoques globais de soja foram também reajustados para baixo: devem ficar em 92,8 milhões de t, volume 7,6% menor que a safra passada ou 7,6 milhões de t a menos. Os mercados devem seguir agitados nos próximos dias.
• Como consequência dos novos números, o preço da saca da soja tem alcançado níveis históricos nos últimos dias. No Brasil, o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) reportou cotações em R$ 197,86/saca (Indicador Esalq/B&MF Bovespa – Paranaguá), no último dia 07 de fevereiro. Estamos nos aproximando dos R$ 200/saca, podendo ainda subir mais caso as produtividades nas colheitas surpreendam negativamente.
• Em relação à questão dos fertilizantes, que é algo que tem preocupado bastante os produtores, as estimativas dizem que cerca de 20% das necessidades de 22/23 já estão compradas. Mas segundo o Itaú BBA, as relações de troca se deterioram bastante. Soja em setembro: 31 sacas para compra de uma t de fosfato monoamômico (MAP) no ciclo 22/23, ante 29 sacas na temporada 21/22. No milho, a relação de troca entre o grão e o cloreto de potássio (KCl) deve passar de 40 sacas por t de MAP em 21/22 para mais de 62 sacas por t em 22/23. No algodão, a relação de troca deve subir de cerca de 24 arrobas por t de MAP para 26 arrobas e de 16 arrobas por t de KCl para mais de 27 arrobas por t de KCl. Vale lembrar que cerca de dois terços do adubo é usado no segundo semestre. Compras devem se concentrar no final do primeiro semestre e no segundo pode haver stress logístico.
• Neste cenário, o Rabobank prevê entregas de 44 milhões de t de adubos no nosso país até o fim de 2022, ante 43 milhões de t projetadas para 2021. Já as estimativas da Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA) e StoneX apontam que 2021 deve fechar com aumento de 8% chegando a 43,8/44 milhões de t. 2020 foi de 40,56 milhões de t.É importante continuarmos de olho nessa conjuntura, afinal há algum risco de desabastecimento: com as restrições na Rússia e China e problemas políticos em Belarus, principalmente no potássio que vem de Belarus; e existem problemas com os embargos.
• Embora muitas culturas tenham entregado boa margem aos produtores, os preços reais dos produtos do agro no Brasil vêm caindo ao redor de 1,8% ao ano nesta década.
• Mais um projeto na linha da economia circular vai acontecer. A UISA e a Geo Biogás anunciaram investimento de R$ 220 milhões para a construção de uma unidade em Nova Olímpia, ao lado da UISA, visando produzir 60 milhões de metros cúbicos equivalentes de biogás a partir da torta de filtro e palha, para uso em energia elétrica, produção de biometano visando substituir o diesel e biofertilizantes para a cana.
• Falando em biogás, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) estima, no documento PDE 2031, que podem ser produzidos 7,1 bilhões de m³ de biogás advindos do setor sucroenergético, produzidos a partir da vinhaça e torta de filtro; e outros 5,7 bilhões de m³ vindos das palhas e pontas da planta de cana-de-açúcar.
• A Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores) informou que vendas de máquinas agrícolas, entre tratores e colheitadeiras, tiveram crescimento de 26% em 2021. Foram 58,4 mil unidades comercializadas no último ano.
• Do lado comercial, o embaixador Orlando Ribeiro Neto afirmou que vê grandes oportunidades para se aumentar as vendas do agro à Índia. Destaca entre os produtos os pulses, os lácteos e o etanol.
• Para concluir a nossa análise geral do agro, os preços dos principais produtos no fechamento desta coluna eram: a soja para entrega em cooperativa de São Paulo estava em R$ 190/sc e R$ 196/sc para junho e R$ 181 para fevereiro de 2023, um sensível aumento. No milho, a cotação atual está em R$ 97,00/sc e a entrega em agosto de 2022 fechou em R$ 74/sc. O algodão fechou em R$ 233/arroba e o boi gordo em R$ 330/arroba, estável neste mês.
Os cinco fatos do agro para acompanhar em março são:
1. Rendimentos na colheita da soja e milho, principalmente, e suas influências nas estimativas da safra;
2. Velocidade do plantio da segunda safra e características do clima sobre esta produção;
3. A evolução da crise energética, preços do petróleo, tensões geopolíticas e preços e disponibilidades de defensivos e fertilizantes;
4. A evolução do quadro político e econômico no Brasil e as consequências no câmbio, que sofreu sensível valorização neste mês;
5. O andamento das exportações (China começa o ano comprando bastante do Brasil) e da economia e o consumo no mercado interno, impactado pelo Auxílio Brasil.
Reflexões dos fatos e números da cana em janeiro/fevereiro e o que acompanhar em março
Na cana
• Nova atualização da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica) reportou uma moagem acumulada de 521,6 milhões de t de cana até o último dia 16 de janeiro, na região Centro-Sul, queda de 12,7% na comparação com o volume registrado no mesmo Fevereiro de 2022 91 período do ciclo passado. Com a maior parte das usinas paradas, em virtude da entressafra, não houve registro de moagem na última quinzena.
• Em relação à qualidade da matéria-prima, indicada em Açúcares Totais Recuperáveis (ATR), a Unica indica que está em 142,9 kg/t, desempenho também menor que no mesmo período do ciclo passado em 1,53%. Para o mix de produção, temos 45,08% para o açúcar e 54,92% para o etanol. Devido à conclusão das atividades na maioria das unidades, estes números devem permanecer os mesmos até o início da moagem, em abril.
• StoneX estima a moagem da nova safra em 563,5 milhões de t, 7,3% a mais, em 7,7 milhões de hectares (Centro-Sul). O aumento se dá principalmente graças às chuvas neste primeiro trimestre. Acreditam que teremos 34,5 milhões de t de açúcar (7,3% a mais) e 29,7 bilhões de litros do etanol (somando a produção vinda do milho), 7,1% a mais.Seriam 16,5 bilhões de litros de hidratado e 9 bilhões de anidro vindos da cana e 4,2 bilhões de litros vindos do milho.
• A produtividade será de 73,5 t/ha (+7,1%) e o ATR deve ficar em 140,7 kg/t (-1,2%). Mix será de 45,5% para açúcar e 54,5% para etanol. Com isso, a participação do hidratado nos automóveis deve voltar a subir dos atuais 25% para quase 30%.
• O Grupo Pedra vai concluir a usina de cana em Paranaíba (MS), com investimentos esperados de R$ 400 milhões. Passará a se chamar Cedro, gerando cerca de 1200 empregos diretos e indiretos. Estava sendo construída há 10 anos e começa a operar em 2024, com cerca de 2 milhões de t, passando a 5 milhões de t depois de 3 anos. Será a quarta usina do grupo, que hoje processa 10,5 milhões de t.
• Bunge e BP certificaram todas as unidades no Brasil para poder exportar etanol aos EUA. É um mercado que caiu bastante para o Brasil, mas pode voltar com a recuperação da economia e aumento do consumo.
No açúcar
• No acumulado entre 1° de abril de 2021 (início da safra 2021/22) e 16 de janeiro de 2022, a região Centro-Sul produziu 32,02 milhões de t de açúcar, queda de 16,16% na comparação com o mesmo período do ciclo passado; dados são da Unica. Sem atividades de moagem nos últimos 15 dias, também não foi registrada a produção do adoçante no período.
• Segundo a Archer Consulting, cerca de 52,5% do açúcar das 25 milhões de t. que serão exportadas no ciclo 2022/23 foram fixados até o final de dezembro num valor médio de R$ 2.143/t a t. É um número abaixo do ano anterior, onde nesta época haviam sido fixados 69% do açúcar a ser exportado, a R$ 1.589 a t. A justificativa pode ser a expectativa de preços maiores face ao preço do petróleo em alta e a paridade com a gasolina, a custos maiores e as incertezas existentes em relação ao início da safra, além da desvalorização do açúcar e valorização do real.
• A Greenpool acredita em déficit de 742 mil t de açúcar para 2022/23, com a produção atingindo praticamente 189 milhões de t e o consumo perto de 190 milhões de t. Para 2021/22 prevê cerca de 2 milhões de t.
• Em âmbito internacional, a produção indiana de açúcar em 2021/22 deve ser de 31,45 milhões de t, tendo esta estimativa aumentado em 3,1% desde a última. O Indian Sugar Mills Association (ISMA) crê num volume de açúcar de 3,4 milhões de t sendo direcionado ao etanol. Exportações devem ser de 6 milhões de t.
No etanol
• Em relação à produção de etanol, no acumulado da safra 2021/22, o volume está em 26,71 bilhões de litros, queda de 9,2% na comparação com o mesmo período do último ciclo. Do hidratado foram produzidos 15,8 bilhões de litros (-19,8%) e do anidro 10,8 bilhões de litros (+12,8%). Do total produzido do biocombustível até aqui, 1,93 bilhão de litros (7,2%) teve o milho como matéria-prima.
• Do lado das vendas, foram comercializados apenas 886,2 mil litros de etanol na primeira quinzena de janeiro, queda de 29,2% na comparação com o mesmo período de 2021. Em janeiro, as comercializações do hidratado ficaram no menor nível desde 2002. No acumulado da safra, foram vendidos 22,05 bilhões de litros, queda de 10,2%, sendo que 1,3 bilhão de litros foi enviado ao mercado externo.
Do total comercializado internamente, 8,14 (39,7%) bilhões de litros eram do anidro e outros 12,58 do tipo hidratado (60,3%).
• A produção total de etanol no Brasil deve fechar 2021/22 em 29,2 bilhões de litros (CONAB). Destes, o volume vindo do milho já chega a 3,3 bilhões de litros. Foi um crescimento de praticamente 30% em um ano. No Paraná, uma unidade em Jandaia do Sul vem atingindo bons resultados como usina flex.
• Do lado dos novos projetos, a Raízen tem apostado bastante no etanol de segunda geração E2G ou etanol celulósico. Devem expandir os investimentos, segundo a empresa ocorre expansão de 50% da produção sem expansão de áreas. É um produto muito valorizado no mercado de uso industrial (setores químico e farmacêutico). A empresa vê ainda oportunidades como combustível sustentável de aviação.
• A Nissan acredita fortemente que o motor com célula a combustível etanol terá testes concluídos até 2025. O carro deve ser lançado ainda antes do final da década. Em nossa visão, este motor trará um novo paradigma no setor de cana. Torcer para vir logo.
Para concluir, os cinco principais fatos para acompanhar em março na cadeia da cana:
1. Com a safra praticamente terminada, observar a posição de estoques de etanol e açúcar e principalmente o consumo de combustíveis. O hidratado vem perdendo muito espaço.
2. O acumulado das chuvas e as produtividades esperadas para a safra 2022, que devem vir maiores, talvez até atingindo 560/570 milhões de toneladas.
3. Os preços do Petróleo. O barril do petróleo tipo Brent voltou a subir fortemente para US$ 92, um sensível aumento no mês. As tensões geopolíticas estão atrapalhando bastante e devem ser monitoradas de perto.
4. A evolução dos preços do açúcar em Nova York. Ao fechar esta coluna estavam em 18,31 cents/libra peso.
5. Os problemas de preços e abastecimento de insumos e as necessidades da cana para boa performance na safra 2022/23. Os investimentos em renovação e nas soqueiras devem ser maiores devido aos bons preços. E os insumos estarão disponíveis e a que preços. Acreditamos que a situação deve melhorar e os preços caírem a partir da metade do ano.
Valor do ATR - na nossa análise referente ao Açúcar Total Recuperável (ATR) ao longo do ciclo 2021/22, temos o seguinte histórico: em abril os preços estavam em R$ 1,0141/kg; maio foram para R$ 1,0564/kg; junho em R$ 1,0630/kg; julho em R$ 1,0878/kg; agosto alcançaram os R$ 1,1425/kg; setembro em R$ 1,209/kg; outubro com R$ 1,2938/kg; novembro em R$ 1,3727/kg; e fechamos 2021 com R$ 1,3264 em dezembro. No primeiro mês de 2022, janeiro, os preços mensais foram de R$ 1,3058/kg, leve queda de 1,5% em comparação com dezembro. No acumulado da safra, estamos com R$ 1,196/kg. Seguimos acreditando que podemos nos aproximar dos R$ 1,23/kg até o final do ciclo.
*Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP, em Ribeirão Preto, e da FGV, em São Paulo, especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio.
**Vítor Nardini Marques é mestrando em Administração de Organizações pela FEA-RP/USP.
***Vinícius Cambaúva é associado na Markestrat Group e mestrando em Administração de Organizações pela FEA-RP/USP
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Fonte: Revista Canavieiros