PRODUTORES DE CANA-DE-AÇÚCAR NA REGIÃO DE RIBEIRÃO PRETO AVALIAM REDUZIR POTÁSSIO PARA GARANTIR LAVOURAS POR CONTA DE SANÇÕES À RÚSSIA
País é o principal vendedor do fertilizante ao Brasil e consequências da Guerra na Ucrânia podem afetar importação. Segundo produtores, atual período é o melhor para a compra
O conflito entre a Rússia e a Ucrânia, iniciado no final de fevereiro, preocupa empresários na região de Altinópolis (SP) e de Jaboticabal (SP), produtores de cana de açúcar e amendoim, por causa do potássio importado para as lavouras.
O risco de desabastecimento e da escalada de preços já implica na discussão de estratégias, como redução do volume de aplicação para dar conta de toda a área plantada no segundo semestre, e na previsão de queda de produtividade.
O Ministério da Economia aponta que, no ano passado, 23% dos adubos ou fertilizantes químicos comprados pelo Brasil vieram da Rússia. Isso significa mais de 9,2 milhões de toneladas de insumos.
De acordo com dados do Itaú BBA, 28% do produto vieram da Rússia. Segundo o diretor da Coplana (Cooperativa Agroindustrial), Sérgio de Souza Nakagi, o potássio é muito utilizado na plantação de amendoim.
"O potássio é um produto essencial para o enchimento de grãos do amendoim, e a Rússia tem uma grande jazida de potássio. Então tudo isso tem um impacto caso o mercado não se regularize", comentou Nakagi.
Na produção de cana de açúcar não é diferente. Segundo o produtor da Alta Mogiana, Marcelo Ravagnane, há a preocupação no abastecimento do potássio.
"O potássio é fundamental para a produção da cana para que ela tenha um alto teor de sacarose. Como o nosso principal fornecedor de potássio é a Rússia e tem esse problema aí com a Ucrânia, a gente prevê sim um problema de abastecimento", disse.
Falta de fertilizantes
Durante os próximos meses é o período que ocorre a compra dos fertilizantes para as próximas plantações. Outra preocupação dos produtores, além do potássio, é o nitrogênio, que também vem da Rússia (20%) e não consegue ser armazenado.
"Você tem o nitrogênio que muitas vezes não suporta ficar muito tempo armazenado, há um período para usar ele e não perder as qualidades. Então a gente não tem estoque de produtos e hoje o que tem está restrito, por isso há a preocupação dessa guerra", explicou o diretor da Coplana.
Ainda segundo Nakagi, em função das sanções que estão sendo impostas, a Lituânia bloqueou a rota usada por Belarus, aliada da Rússia, para escoar potássio. O país é responsável por 6,1% das importações brasileiras de potássio.
Para o presidente do Sindicato Rural de Altinópolis (SP), Guilherme Salomão Vicentini, todas as culturas serão afetadas com essa indecisão, pois esse é o melhor momento para a aquisição de fertilizantes.
"Isso dificulta os novos pedidos. Esse é o momento oportuno onde o produtor consegue se organizar e efetuar as suas compras com tempo hábil para as entregas e logísticas. As próximas semanas serão decisivas para os produtores brasileiros", explica.
O produtor rural de Altinópolis, Roberto Rossetti, diz que não está fácil encontrar os produtos e, se isso continuar, a partir de maio ele não terá o suficiente, precisando diminuir as doses de fertilizantes usadas.
"A gente pode ter que tentar reduzir doses do fertilizante para tentar adubar todas as áreas. Isso aí é bem possível, pode acontecer. Consequentemente, para o próximo ano a produtividade da lavoura será menor", afirma.
Para Rossetti, os preços também são uma grande preocupação, pois mesmo antes do conflito entre a Ucrânia e a Rússia eles já estavam altos. "Os fertilizantes hoje são um dos maiores custos da lavoura e já tiveram uma elevação muito grande por conta do dólar nos últimos anos", diz.
Impacto na comercialização
A plantação de cana funciona em rotatividade com a de amendoim -- uma ajuda a outra na recuperação do solo para o novo plantio. De acordo com o diretor da Coplana, a safra do amendoim está programada para terminar em abril. Depois, até outubro, essa parte da terra é utilizada para o plantio de cana.
"Dentro da propriedade há talhões (unidades de cultivo). Então tem uma unidade de primeiro corte, segundo, terceiro. A de quinto vai ficando degradado ao longo dos anos. Aí você reforma essa unidade com o amendoim. É a rotação por partes. Todo ano você terá uma parte de terra reformando e virando amendoim", explica.
Após a finalização da colheita do amendoim, de maio até abril do próximo ano ocorre o que eles chamam de ano agrícola, ou seja, o período de vendas das sacas. Nesse período, segundo Nakagi, os produtores podem ser afetados pelo conflito entre a Ucrânia e a Rússia.
Esses impactos podem vir principalmente do banimento da Rússia no sistema de transações financeiras entre países. Essas sanções foram uma forma de punição da comunidade internacional pelos ataques contra a Ucrânia.
"Tem que haver um entendimento entre as partes o quanto antes. Caso isso não aconteça, vai impactar talvez não só o preço, mas a comercialização também. Essas sanções econômicas podem travar todo esse trabalho que foi feito desde outubro quando o produtor colocou a semente. E quem sabe futuramente possa afetar o próximo ano de safra", disse.
Em 2021, o Brasil vendeu US$ 1,6 bilhão em produtos para os russos, o que colocou o país comandado por Vladimir Putin como o 36º colocado no ranking de exportações brasileiras. A Ucrânia tem um menor destaque na balança comercial brasileira, mas ainda assim é significativa. Para o país, o Brasil vendeu US$ 227 milhões em 2021.
Tanto Rússia como Ucrânia têm o amendoim como o principal produto importado do Brasil: 39,25% da produção brasileira vão para a Rússia, o que equivale a US$ 129,7 milhões faturados. Já a Ucrânia é responsável pela compra de 8,83% da produção, o que corresponde a US$ 29,2 milhões.
Só a região de Jaboticabal (SP) corresponde a 37% de toda a leguminosa que foi exportada pelo país em 2021, segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços. Atualmente na Coplana há 125 cooperados cadastrados no setor de amendoim, presentes nas cidades também de Guariba e Dumont (SP).
"Nós estamos aguardando que isso cesse. A Rússiau é nossa parceira que importamos os fertilizantes, ao mesmo tempo que exportamos amendoim. Se ela não pensar ´olha, a gente precisa ter alimento e não sair fertilizantes´, isso entra em colapso", diz Nakagi.
Fonte: Portal G1